sexta-feira, 29 de junho de 2007

Lousa digital dispensa giz e apagador

Lousa digital dispensa giz, apagador ecoloca a educação na ponta dos dedos


O formato é igual ao de uma lousa comum da sala de aula. Mas, com um toque na tela branca, o professor Sérgio Ferreira do Amaral abre o banco de imagens de geografia e, na ponta do dedo indicador, arrasta o contorno do mapa da América do Sul; outro arraste e o mapa do Brasil vai para dentro do anterior. Assim, ele poderia ir incluindo os demais países, até montar o quebra-cabeça do continente.
Brincadeira de criança? A idéia é mais ou menos esta. A lousa digital instalada no Laboratório de Novas Tecnologias Aplicadas à Educação (Lantec), da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp, é o principal instrumento de Sérgio Amaral para desenvolver suas pesquisas voltadas a conteúdos educacionais usando a tecnologia do vídeo digital interativo.
Software propicia ambiente de interação
A interatividade, ao invés da passividade do aluno diante da oratória do professor, é o caminho indicado por Amaral para tornar o espaço escolar mais adequado à realidade atual do aluno. “Um toque faz com que o computador processe a informação e jogue o sinal na lousa. A criança abre as telas e navega usando o recurso mais interativo que existe: o dedo”.
O apagador e as canetas lembrando gizes, no aparador da lousa, são apetrechos praticamente simbólicos, pois ali a criança pode escrever também com o dedo. Se esta possibilidade provoca arrepios em quem defende o velho caderno de caligrafia, o professor da Unicamp atenta que o contexto, agora, traz um novo paradigma de interface lúdica entre homem e máquina nas atividades educacionais.
O software desenvolvido pelo Lantec utiliza um emulador baseado na linguagem Java para criar um ambiente de interação com o conteúdo digital. É um software aberto, o que permite ao professor preparar a aula em casa, baixando da Internet ou escaneando conteúdos como textos, mapas, fotos, além de vídeos e sons.
“A grande maioria dos professores possui computador. O problema é que eles ainda centram a sua sistematização didática unicamente na forma de papel, pautados na oralidade, devido à falta de familiaridade com as práticas didáticas mediatizadas pelos recursos audiovisuais”, atesta o pesquisador. “É necessário oferecer a eles essas novas habilidades e competências para a preparação do conteúdo didático a ser utilizado em sala de aula”.
Conteúdos – Amaral esclarece que a tônica das pesquisas no Lantec não está na tecnologia, substituindo o lápis, o caderno e o livro, mas no desenvolvimento de conteúdos que permitam criar uma situação motivadora, com a participação da criança no processo de ensino-aprendizagem, intervindo efetivamente no conteúdo. “Propomos uma reflexão crítica do paradigma atual, discutindo o formato e principalmente a ação comunicativa”.
O conteúdo didático, reitera o pesquisador, precisa apoiar-se em uma linguagem com a qual a criança já está familiarizada. Ao mesmo tempo, a estratégia de comunicação e o diálogo com o aluno não pode ser linear, mas construídos a partir do seu envolvimento. “As crianças devem participar da discussão e da elaboração do conteúdo de forma ativa e sobretudo coletiva, e não ficar apenas ouvindo o discurso do professor”.
O pesquisador observa que vivemos uma época em que a informação é disponibilizada e atualizada o tempo todo. “Ao acessarmos um texto, encontramos nele o link para outro texto com informações complementares e assim sucessivamente. É uma porta atrás da outra. Além disso, muitas vezes o leitor dispõe de portas para fazer a sua intervenção. A escola é o espaço para a reflexão crítica destas informações”.
Na opinião de Sérgio Amaral, esta lógica já consolidada torna o desenvolvimento de conteúdos educacionais um trabalho bem mais complexo. A Internet tornou-se um exemplo de que os conteúdos precisam estabelecer um diálogo com aqueles que os recebem. “O leitor quer participar”.
Por tudo isso, o Lantec aposta na tecnologia de ponta direcionada ao desenvolvimento de conteúdos utilizando a linguagem do vídeo digital interativo, e nas metodologias e aplicações que permitam ao professor elaborar o seu próprio conteúdo. “Alguns produtos do nosso laboratório já estão à espera de patente. Há uma grande demanda por conteúdos educacionais em português com o uso dessas novas tecnologias”.
Ociosidade – O professor da Unicamp reconhece o esforço do governo para equipar as escolas com computadores, mas estima que são aproveitados apenas 30% da capacidade já instalada. “A causa principal é a falta de capacitação do professor na utilização pedagógica do computador. Vejo escolas que ainda estão com os equipamentos guardados na caixa, por pura falta de aplicabilidade, e onde a sala de informática é freqüentada apenas para navegação na Internet”.
Amaral afirma que a universidade, no caso da lousa do Lantec, cumpre sua função de se adiantar ao processo, mas assegura que esta tecnologia logo estará presente nas escolas brasileiras. “O importante é criar uma cultura e desenvolver metodologias para incorporar a interatividade como prática pedagógica, centrados em programas de capacitação dos professores. Do contrário, teremos apenas uma exposição multimídia, levando à repetição do fenômeno de ociosidade dos computadores”.

Bye
Ana Paula Aires

Fonte: Jornal da Unicamp